A centésima-sétima edição do Grand Record Brazil é dedicada a um dos maiores cantores da era de ouro do rádio brasileiro. Estamos falando de Nuno Roland. Nosso focalizado veio ao mundo na cidade de Joinville, Estado de Santa Catarina, no dia primeiro de março de 1913, batizado com o nome de Reinold Correia de Oliveira. Ainda menino, ele tocava tarol e caixa na banda da cidade de Teixeira Soares, no Paraná. Aos 13 anos, mudou-se com a família para outra cidade catarinense, Porto União, tendo trabalhado como balconista, telegrafista e bancário. Após servir o exército, em 1931, transferiu-se para a cidade gaúcha de Passo Fundo, onde começou sua carreira, conseguindo emprego de cantor e baterista em um cassino, e apresentando-se com seu nome verdadeiro, Reinold de Oliveira. Em 1932, alistou-se como voluntário no Sétimo Batalhão de Caçadores de Porto Alegre, para entrar em combate na Revolução Constitucionalista daquele ano. Veio com sua tropa para São Paulo, e na ocasião fez amizade com outro soldado, então crooner da jazz band do batalhão: nada mais nada menos que Lupicínio Rodrigues, posteriormente célebre compositor. Encerrada a Revolução, o cantor voltou a Porto Alegre, e, com apenas 19 anos, assinou seu primeiro contrato profissional, com a Rádio Gaúcha, posto ter se destacado como cantor em uma apresentação radiofônica da jazz band do batalhão em que estava lotado. Em 1934, muda-se para São Paulo, onde fez sucesso apresentando-se inicialmente na Rádio Record (então “a maior”), recebendo pequenos cachês. Mais tarde,com o apoio do violonista Garoto, consegue um contrato com a Rádio Educadora Paulista. E é nessa ocasião que passa a adotar o nome artístico pelo qual ficou conhecido em todo o Brasil: Nuno Roland. Ainda em 1934, grava seu primeiro disco, na Odeon, com duas composições de Sivan Castelo Neto (pseudônimo de Ulysses Lelot Filho): a valsa “Pensemos num lindo futuro” e a canção “Cantigas de quem te vê”. Dois anos mais tarde, Nuno muda-se para o Rio de Janeiro e torna-se um dos pioneiros da PRE-8, Rádio Nacional, onde estreia no dia de sua inauguração, 12 de setembro de 1936. Durante onze anos foi também crooner da orquestra do Copacabana Palace Hotel. Em cerca de quarenta anos de carreiro, Nuno Roland gravou ainda nos selos Columbia, Victor, Belacap, Carroussel, Caravelle, Todamérica e Continental. Nesta última marca, ele viveu a melhor fase de sua carreira, registrando inúmeros sucessos, no carnaval e no meio-de-ano. Seu currículo também inclui duetos com Cármen Miranda, Linda Batista e Emilinha Borba. Integrou ainda, juntamente com Albertinho Fortuna e Paulo Tapajós,o Trio Melodia, formado na Nacional para apoio do superprograma “Um milhão de melodias”, e as carreiras individuais de seus integrantes prosseguiriam sem quaisquer problemas. As participações de Nuno nos programas musicais da emissora da Praça Mauá eram consideradas de alta qualidade artística. Sua atividade artística declinou na década de 1960, gravando esporadicamente nesse período. Em 1968, participou, ao lado de Marlene e Blecaute, do espetáculo “Carnavália”, que ficou em cartaz no Rio por quase um ano. Nuno Roland faleceu em 20 de dezembro de 1975, também no Rio, aos 62 anos. De sua gloriosa trajetória fonográfica, o GRB foi buscar dezoito faixas, notáveis exemplos de sua arte, assinadas por alguns de nossos maiores compositores populares. Pedro Caetano, por exemplo, assina a faixa de abertura, “Guarapari”, célebre canção que homenageia a cidade do litoral do Espírito Santo famosa pelas suas praias com areias monazíticas. Nuno Roland a imortalizou na Todamérica em 8 de março de 1951, com lançamento em abril seguinte sob n.o TA-5053-B, matriz TA-102. A faixa seguinte é um clássico imortal do carnaval brasileiro: a marchinha “Pirata da perna de pau”, uma das mais expressivas contribuições do grande João de Barro, o Braguinha, para o repertório momesco , aliás Nuno Roland foi um dos melhores intérpretes do compositor. Imortalizada por ele na Continental em 3 de setembro de 1946, com lançamento em novembro seguinte sob n.o 15727-A,matriz 1591, “Pirata da perna de pau” foi merecido sucesso no carnaval de 47, sendo lembrada até hoje com muita, muita justiça. “Cai, sereno”, a faixa 3,é um batuque assinado por outro mestre, Assis Valente: “Cai, sereno”, que Nuno registrou na Odeon em 18 de maio de 1939, com lançamento em julho do mesmo ano, disco 11734-A, matriz 6094. O samba “Covardia”, que encontraremos logo em seguida, é de uma dupla “braba”, Ataulfo Alves e Mário Lago. Foi, aliás,o primeiro trabalho conjunto deles, de uma série de oito, entre eles os clássicos “Ai, que saudade da Amélia” e “Atire a primeira pedra”. Nuno gravou “Covardia”,também na Odeon, em 16 de agosto de 1938, com lançamento em outubro seguinte sob n.o 11646-B, matriz 5903. E quem nunca entoou aquela famosa música do “Lobo mau” (“Eu sou o lobo mau, lobo mau,lobo mau”…), da história de Chapeuzinho Vermelho, tão bem adaptada e musicada por Braguinha? Pois ele a reaproveita, junto com Antônio Almeida, na faixa 5, como marchinha para o carnaval de 1951, que Nuno Roland, à frente do já citado Trio Melodia, lançará na Continental em janeiro desse ano, disco 16344-A, matriz 2475. Outro presente de Ataulfo Alves para Nuno, agora tendo Jorge Faraj na parceria, é essa joia de valsa, “Mil corações”, que o cantor grava na Odeon em 28 de março de 1938,com lançamento em julho do mesmo ano, disco 11603-A,matriz 5747. O beguine “Ballerina”, de Carl Sigman e Bob Russell, foi publicado nos EUA em 1947, tendo merecido gravações por Nat King Cole e Bing Crosby, entre outros. Dois anos mais tarde, Oswaldo Santiago escreve a letra brasileira, com o título de “Bailarina” mesmo, para Nuno Roland gravar na Continental, com lançamento entre julho e setembro de 1949,sob n.o 16087-A, matriz 2102. Raridade absoluta é também o samba “Dia dos meninos”, da parceria Wilson Batista-Jorge de Castro, provavelmente gravado por Nuno Roland em 1960, numa etiqueta de curta duração, a Popular, tendo o disco recebido o número 0011-A,matriz DPM-21. “Peixe vivo”, motivo do folclore mineiro, e por sinal a música favorita de Juscelino Kubitschek de Oliveira, político nascido em Diamantina que chegou à presidência da República (governou de 1956 a 1961), é aqui apresentada por Nuno Roland em tempo de baião, ritmo então na moda, num arranjo de Antônio Almeida. Gravação Todamérica de 26 de junho de 1951, lançada em agosto seguinte com o número TA-5084-A, matriz TA-169. A dupla Alcebíades “Bide” Barcellos-Armando Marçal , responsável por clássicos como “Agora é cinza”, “Ando sofrendo” e “Barão das cabrochas”, aqui comparece com o samba “Perdão, meu bem”, que Nuno Roland grava na Odeon em 3 de novembro de 1939 para o carnaval de 40, sendo lançado um mês antes da folia, em janeiro, com o número 11807-B, matriz 6245. O famoso tango “Por ti eu me rasgo todo (Por vos yo me rompo todo)”, do uruguaio Francisco Canaro (que, a exemplo do francês Carlos Gardel, fez carreira na Argentina), ganha aqui uma versão em ritmo de samba, com letra brazuca de César Siqueira, que Nuno Roland irá registrar também na Odeon em 5 de setembro de 1939, indo para as lojas em novembro com o n.o 11781-A,matriz 6191. Em seguida, por intermédio de Luiz Bittencourt e Murilo Caldas (irmão de Sílvio), Nuno Roland pergunta em ritmo de samba: “Quem é que está com a razão?” Gravado na Continental em 3 de setembro de 1946, permaneceu, no entanto, quase um ano na gaveta, e só saiu em julho de 47 sob n.o 15787-A, matriz 1590. O samba do lado B, que vem logo em seguida, foi gravado em 2 de maio de 1947, matriz 1655, é mais um clássico imortal de Braguinha, aqui com seu inseparável parceiro Alberto Ribeiro: o belíssimo “Fim de semana em Paquetá”, sob medida para a notável interpretação de Nuno Roland, devidamente acompanhado pela orquestra de cordas de Eduardo Patané (a mesma do registro original de “Copacabana”, com Dick Farney). Até hoje é bastante conhecido e tem inúmeras regravações. Também de Braguinha e Alberto Ribeiro é outra antológica marchinha carnavalesca: “Tem gato na tuba”, da folia de 1948, que Nuno Roland imortaliza na mesma Continental em 23 de setembro de 47, com lançamento ainda em dezembro sob n.o 15843-B, matriz 1727. Vencedora do concurso oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, “Tem gato na tuba” foi também interpretada por Nuno Roland no filme “Esta é fina”, e jamais seria esquecida, tendo regravação até mesmo pela Turma do Balão Mágico! Outra raridade é “Volta”, samba-canção de Radamés Gnattali e Luiz Bittencourt, que Nuno Roland lança em 1953 no LP coletivo de dez polegadas “Show”, da Musidisc de Nilo Sérgio, por sinal uma das gravadoras pioneiras do vinil, e que encerrou definitivamente suas atividades em 2013. Braguinha, agora sem parceiro, é o responsável por outra imortal página carnavalesca: a marchinha “Serenata chinesa”, um dos hits da folia de 1949, que Nuno imortaliza na Continental em 13 de outubro de 48 e vai para as lojas um mês antes do carnaval, em janeiro, com o número 15971-A, matriz 1983. Da santíssima trindade Wilson Batista-Claudionor Cruz-Pedro Caetano é o samba “Senhor do Bonfim te enganou”, dueto de Nuno Roland com Dircinha Batista, em gravação Odeon de 5 de outubro de 1939, só lançada em maio de 40, disco 11834-B, matriz 6240. Para encerrar com chave de ouro, outro grande hit carnavalesco de João “Braguinha” de Barro: “Tem marujo no samba”, em que Nuno Roland tem a notável companhia da eterna “Favorita”, Emilinha Borba. Um dos hits do carnaval de 1949, por sinal um dos mais ricos musicalmente, foi gravado na Continental em 13 de outubro de 48, com lançamento um mês antes da folia, em janeiro, sob n.o 15980-B, matriz 1994, tendo sido também apresentada no filme “Estou aí?”, de Moacyr Fenelon. Não poderia haver melhor fecho para esta brilhante retrospectiva que o GRB dedica a Nuno Roland. Divirtam-se e até a próxima!
Texto de Samuel Machado Filho