Ademilde Fonseca – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 16 (2012)

No dia 27 de março de 2012, o Brasil perdeu uma de suas cantoras mais expressivas, e um autêntico ícone da chamada era do rádio: Ademilde Fonseca Delfim. E o Grand Record Brazil presta merecida e expressiva homenagem a esta que foi conhecida como “rainha do chorinho”, reunindo 40 preciosas gravações em 78 rpm, selecionadas entre as mais de 80 deixadas pela cantora nesse formato. Ademilde nasceu em Macaíba, RN, em 4 de março de 1921. Aos quatro anos de idade mudou-se com a família para a capital potiguar, Natal, ali vivendo até 1941. Gostava de cantar desde criança, e ainda na adolescência começou a se interessar por serestas, travando conhecimento com músicos lá de Natal. Foi com um desses seresteiros, Naldimar Gedeão Delfim, que Ademilde contraiu núpcias, indo morar com ele no Rio de Janeiro. Em 1942, após um teste na Rádio Clube do Brasil, apresentou-se no programa de calouros “Papel carbono”, de Renato Murce. Nesse mesmo ano cantou em uma festa, acompanhada pelo regional do flautista Benedito Lacerda, o choro clássico “Tico-tico no fubá”, de Zequinha de Abreu, com letra do dentista Eurico Barreiros, que a havia feito especialmente para sua filhinha Ely cantar, onze anos antes, sendo tal letra conhecida por Ademilde desde menina. Benedito gostou tanto de sua interpretação que a levou à gravadora Columbia (futura Continental), cujo diretor artístico era o grande João “Braguinha” de Barro, para registrar seu primeiro disco. Isso se deu em 10 de agosto de 1942, e foi a primeira vez que o “Tico-tico” foi gravado com letra, e sete anos depois da morte de Zequinha de Abreu. Lançado em setembro seguinte com o número 55638, o disco trouxe no verso o samba “Volte pro morro”, do próprio Benedito Lacerda com Darcy de Oliveira. Nele também comparece como sanfoneiro o grande Luiz Gonzaga, certamente não creditado no selo por ser contratado da RCA Victor. E os chorinhos cantados por Ademilde foram se sucedendo, sempre com sucesso: “Apanhei-te, cavaquinho”, “Urubu malandro”, “Brasileirinho”, “Teco-teco”, “O que vier eu traço” “Pedacinhos do céu”, “Pinicadinho”, etc., dando à cantora o título incontestável de “rainha do chorinho”. Em 1944, levada pelo cantor Déo, Ademilde foi para a Rádio Tupi (“o cacique do ar”), apresentando-se com os regionais de Claudionor Cruz e Rogério Guimarães. Em 1952, ela seguiu para a França, junto com a Orquestra Tabajara de Severino Araújo para participar de um espetáculo produzido em Paris pelo jornalista e empresário de comunicação Assis Chateaubriand, dono dos Diários e Emissoras Associados. Em 1954, transferiu-se para a então poderosa Rádio Nacional, onde se apresentou com os regionais de Canhoto (Waldomiro Frederico Tramontano), Jacob do Bandolim e Pixinguinha, e também das orquestras de dois “cracões” da emissora da Praça Mauá, Radamés Gnatalli e Chiquinho. Em 1964, a cantora fez uma excursão pela Península Ibérica (Portugal e Espanha), ao lado de nada mais nada menos que Jamelão, sendo que em Lisboa Ademilde ficou cerca de seis meses em cartaz. Após quinze anos de afastamento, em 1975, Ademilde voltou ao disco, lançando um bem cuidado LP na marca Top Tape, apresentado-se, durante essa década, em shows no Teatro Opinião, do Rio. Participou do CD coletivo ‘Café Brasil”(2001) e do espetáculo “As eternas cantoras do rádio”, ao lado de Violeta Cavalcanti, Carmélia Alves e Ellen de Lima. Nos últimos anos de vida, Ademilde vinha fazendo shows juntamente com a filha, Eymar Fonseca, mostrando que ainda estava em plena forma. Dias antes de falecer, aos 91 anos de idade, a cantora havia gravado uma entrevista para o programa “Sarau”, da emissora de TV paga Globo News. Nesta décima-sexta edição do GRB, inúmeros momentos expressivos da carreira de Ademilde Fonseca. “Tico-tico no fubá”, claro, está nesta seleção, e é a primeira faixa. Ao lado de outros chorinhos famosos, como “Apanhei-te, cavaquinho”, “Doce melodia”, “Galo garnizé”, Dinorah”, tem também samba de carnaval (“Sentenciado”), baião (“Meu Cariri”, co-autoria de Dilú Mello, também responsável pelo hit “Fiz a cama na varanda”, sendo que na época do lançamento desse baião, 1953, havia uma gravíssima seca no Nordeste), toada (a bem-feitinha “Se amar é bom”, melodia de José Maria de Abreu e letra de Antônio Domingues, o lado B do disco de “Meu Cariri”), música de festa junina (“Fogueira”, também de Abreu com Jair Amorim), e até mesmo a curiosa “Baião em Cuba”, mostrando a nítida semelhança do baião com os ritmos afro-caribenhos então em moda, tipo rumba, mambo, etc. O clássico baião “Delicado” também marca ponto, e dada a tessitura rítmica, só Ademilde poderia gravá-lo, posto ser um “baião -choro”, com a vertiginosa rapidez que lhe era peculiar. Enfim, uma riquíssima e expressiva retrospectiva da carreira desta insubstituível cantora que é Ademilde Fonseca.

Pra terminar, eu gostaria de fazer uma solicitação que nada tem a ver com esta resenha, mas que o próprio Augusto me sugeriu. Estou à procura da música “Maria da Piedade”, de Evaldo Ruy, que foi a primeira gravação do cantor Mauricy Moura (Santos, SP, 1926-São Paulo, 1977). Ela saiu pela Sinter em maio de 1952, no 78 de número 142-A (com um monte de zero antes!). Teve inclusive um blogueiro chamado Marcos Massolini, também jornalista e poeta, que administra o blog Almanaque do Malu (é o apelido dele) que comprou em um sebo da Av. Duque de Caxias, centro de São Paulo, um LP de 10 polegadas chamado “Meia-noite”, também da Sinter, claro, que reproduz a gravação do Mauricy pra “Maria da Piedade”, mostrou a capa do disco no blog, tudo, mas não o disponibilizou para download. Cheguei a escrever ao tal Malu pedindo uma cópia em mp3 do “Maria da Piedade”, ele até me respondeu dizendo que ia mandar, mas já se passaram três semanas… e nada! Talvez seja precipitação minha, mas duvido de que ele cumpra sua promessa. Por essa razão, solicito aos amigos cultos e ocultos do TM, que acompanham estas minhas resenhas do GRB, que se alguém tiver o “Maria da Piedade” com Mauricy Moura, enviem uma cópia em mp3 pro email do TM, que aí o Augusto me repassa. Combinado? Por ora, curtamos a inesquecível Ademilde…


* texto de Samuel Machado Filho



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